Entre Muros e Segredos Cap 24
Quando encontramos a felicidade depois da luta.
Era curioso pensar naquela situação. Há algum tempo, Pedro não estranharia essa reação do pai, ou talvez até esperasse menos compreensão e mais acusações. Mas, talvez, de fato, fosse pior receber um abraço solidário que contrariasse a dignidade do abraçado. Afinal, não era uma demonstração de carinho que trazia conforto.
Pedro sentiu um leve enjoo naquele instante e torcia para que os segundos passassem rápido, para que seu pai finalmente o soltasse. Quando isso aconteceu, ele permaneceu de cabeça baixa, com um semblante de tristeza evidente. Sem dúvida, havia se transformado em outra pessoa, pois antes quase nunca se notavam mudanças de humor em sua expressão.
Já Silveira ainda se desmanchava em lágrimas e culpa. O pobre pai levou a mão ao rosto, e suas lágrimas irritavam bastante o filho. Quando finalmente encarou Pedro, viu-o desolado, o que fez seu choro cessar imediatamente.
— Por que essa cara, Pedro?
— Não... nada...
Silveira não compreendia aquela tristeza, pois era claramente diferente de qualquer sentimento esperado para aquele momento. Então, deixou de lado suas próprias emoções e passou a se preocupar com as sensações do filho.
— Como assim, nada? Que cara é essa? Nunca te vi assim...
Ele se aproximou novamente de Pedro, pousou as mãos nos ombros dele e tentou decifrar seus pensamentos. Pedro, por sua vez, queria fugir do pai e esquecer que ouvira aquela frase.
— Não, pai, deixa pra lá... — disse, virando o rosto.
— Pedro, eu quero saber. Sou seu pai. Quero entender! — insistiu com firmeza.
— A culpa de eu ser assim não é sua...
— É, sim. Eu errei com você, com sua educação. Não deveria ter sido tão duro...
— Pai, o senhor, não. Eu posso entender que o Breno seja o idiota que é, mas o senhor, não... Por favor, não faça isso comigo. Por favor, pai, por favor... — confessou, aos prantos.
As lágrimas de Pedro caíram com tanta rapidez e sua voz embargou de tal forma que atingiu o peito de Silveira como uma fina e longa agulha. Ele não pôde reagir de outra maneira senão abraçando o filho instantaneamente. Teve medo do que Pedro estava pensando. "Tadinho, ele está com medo!"
— Pedro, você não precisa ter medo. Eu estou aqui. Sua mãe e sua irmã também... Nós estamos aqui e vamos te ajudar a superar isso.
Pedro se afastou do pai, ainda mais irritado.
— Eu não vou superar isso, pai. Eu sou assim, e o senhor vai ter que aceitar. Não é culpa sua se eu sou gay. Talvez eu sempre tenha sido, mas nunca soube... Mas o senhor...
— Pedro, do que você está falando?
— Do seu pensamento errado sobre quem eu sou ou sobre quem eu decidi ser...
— Pedro... — Silveira coçou a cabeça. — Ainda não entendi. Você acha que eu estou falando do quê?
— O senhor disse que a culpa de eu ser gay é sua, mas não...
— Pedro, Pedro... Calma... Você entendeu tudo errado!
Silveira voltou a coçar a cabeça e caminhou um pouco sobre a grama. Deu as costas para o filho e sentou-se em um banco de metal que havia ali. O céu já não era o mesmo de horas atrás. A lua estava cheia e iluminava tudo sem precisar do auxílio de nenhuma lâmpada elétrica. Parecia que a chuva apenas lavara a face da lua, para que esta surgisse ainda mais esclarecedora. De fato, ela precisava iluminar certas mentes.
Pedro caminhou até o pai, mas permaneceu de pé diante dele, com a testa franzida, ávido por respostas.
— Você entendeu tudo errado, Pedro. Eu nunca disse que a culpa de você ser gay é minha. Na verdade, estou dizendo o contrário. A culpa de você não ser gay é minha.
O discurso de Silveira, obviamente, não pararia por aí. Pedro se viu em uma situação confusa, mas decidiu permanecer calado, esperando a continuação do pai. Ao que tudo indicava, Silveira tinha algo sério para admitir, invertendo as posições naquele diálogo. Ele levou as mãos ao rosto mais uma vez e tentou recuperar o fôlego para finalmente revelar ao filho o que sentia sobre aquele momento.
— Quando eu disse que a culpa de você ser assim é minha, eu quis dizer que a culpa de você ser quieto, calado, inexpressivo... Esse medo que você tem das pessoas e de se relacionar com elas... A culpa de você ser assim é minha.
— O que você tem a ver com isso?
— Você não se lembra, não é? — perguntou Silveira, olhando-o nos olhos.
Aquela pergunta o tocou fundo. Pedro não sabia o que viria depois, mas, ao ouvir aquelas palavras, sua respiração ficou ofegante e seu peito se expandiu. Ao mesmo tempo em que suava, sentia pequenos arrepios no pescoço e nas costas. Ele não sabia por que aquilo lhe causava tais reações. Temendo as palavras que viriam a seguir, permaneceu em silêncio.
— Lembra do Guguinha, o seu primo? Vocês tinham oito anos...
— Lembro, mas o que aconteceu?
— Não lembra? Você e o Guga?
— Não... Lembro que brincávamos muito juntos, mas depois... Não sei por que nunca mais nos vimos.
— Você não se lembra do dia em que estavam no meu quarto? Vocês estavam brincando de beijar na boca, de língua. Abraçados... Duas crianças pequenas. Vocês estavam se divertindo, rindo e se beijando. Naquele momento, eu vi algo grotesco, inimaginável. Ainda mais quando descobrimos que vocês sempre brincavam daquilo...
— Eu não me lembro disso!
— Não se lembra de como eu briguei com vocês? Dos tapas que eu te dei?
— Você me bateu? — perguntou Pedro, surpreso.
— Bati... — confessou Silveira, voltando às lágrimas. — Eu não soube como lidar com aquilo.
— Não, não estou te recriminando. Eu só quero entender o que aconteceu.
— Mas eu estou me recriminando. Eu não poderia ter feito aquilo. Você era só uma criança. Um bebê, praticamente.
— O que mais você fez?
— Eu gritei com vocês dois e puxei você pelo braço. Estava com muita raiva e te arrastei pela casa. Na sala, sentei no sofá e te coloquei na minha frente. Gritei olhando nos seus olhos e apontei o dedo várias vezes. Mas você nem estava entendendo nada. Você era só uma criança... Me perdoe, Pedro, me perdoe!
Aos poucos, algumas coisas começaram a fazer sentido para Pedro. Seu coração se acalmava, mas sua mente fervilhava com a história. Muitos erros haviam sido cometidos, e as consequências foram as piores possíveis.
— Foi por isso que o Gustavo se matou?
— Sim... sim, sim, sim... Como eu me arrependo... Me perdoe, Pedro, me perdoe, por favor. Eu não queria isso, nem eu, nem o seu tio...
— Pai, se acalme. Eu não estou culpando você de nada.
— Mas eu estou! Porque eu sei que sou culpado!
— Pai, você não é culpado. Se fosse, eu também teria me matado. Quem causou as dores do Gustavo foi o tio Flávio, que perpetuou as críticas. Você não fez isso comigo.
— Mas eu te impedi, naquele momento em que briguei com você, de se descobrir, de viver sua vida. Você se tornou uma criança fria e inexpressiva e levou isso adiante. Você sempre teve poucos amigos... A culpa é minha!
— Tudo passa, pai.
— Mas o Guguinha...
— O Gustavo não foi sua culpa. Não era sua responsabilidade.
— Não é isso... Ele... Ele deixou um bilhete pra você.
— Pra mim?
— Não exatamente para você, mas sobre você. Ele disse que te amava e pediu desculpas por ter te prejudicado... O que fizemos?
Pedro parecia estar descobrindo sua própria vida naquele momento. Era, sem dúvida, uma revelação impactante, que não poderia ser esquecida e que, com certeza, influenciou muitas das escolhas que ele fez ao longo de sua existência, mesmo sem perceber.
Silveira, por sua vez, não conseguia imaginar como um simples ato, ocorrido em poucos minutos, pôde desencadear uma série de acontecimentos trágicos. Até aquele momento, ele se responsabilizava por todas as tristezas que haviam acontecido em sua família, no que se referia àquele assunto.
Pedro, ao saber do bilhete do primo, sentiu uma leve fraqueza nas pernas e sentou-se ao lado do pai.
— Foi por isso que vocês fizeram as pazes, você e o tio?
— Seu tio me deu uma lição de compaixão que jamais vou esquecer.
Silveira virou-se um pouco para o filho e segurou suas mãos.
— No dia do velório do Guguinha, ele me chamou na capela e me disse... Não, ele me pediu que eu não cometesse o mesmo erro. Me disse para deixar você ser quem você era.
Eu disse ao seu tio que não teria problema, depois de tudo o que passamos, que você fosse gay. Mas também disse que, mesmo assim, você não era.
Ele me repreendeu. Disse: "Como o Pedro não é gay? Você acha que ele é do jeito que é à toa? Se ele não fosse, não teria reagido tão mal desde aquele dia em que você brigou com ele."
Foi então que percebi que seu tio poderia estar certo. Essas coisas entre crianças são comuns, mas você não teria sido tão afetado pelos meus gritos se não fosse gay. Se não fosse... teria esquecido aquela bronca e continuado brincando como qualquer outra criança. Mas não. Você sentiu que havia algo diferente. E foi naquele momento que você descobriu que essa sua diferença era algo errado.
Não havia mais nada a ser revelado. Pedro agora era um homem de verdade e já podia se considerar dono de sua vida. Ele precisava se conhecer melhor, mas nunca imaginou que desconhecesse tantas coisas sobre si mesmo e sua família. Finalmente, as lágrimas retornaram, mas de forma sutil. De frente para o pai, segurando suas mãos, ele continuou o diálogo.
— Por isso você se tornou tão amável nesses últimos anos. Tão compreensivo e, ao mesmo tempo, tão enérgico contra a minha quietude.
— Sim...
— Por isso você se apegou tanto ao Igor.
— Sim... Eu... Eu reconheço nele a força que faltava...
— Em mim.
— Não. A força que faltava em Guguinha.
— Por isso você sempre se referiu ao Gustavo como Guga ou Guguinha...
— Ele não conseguiu ser grande como o Igor, mesmo que ambos tivessem tido o mesmo pai.
— Então os seus gritos me salvaram, pai.
— Como? — perguntou surpreso.
— Seus gritos me anestesiaram, me paralisaram. Talvez, se eu tivesse dado continuidade à minha vida como o Gustavo deu... Talvez eu não me aceitasse, talvez eu me rebelasse. Talvez eu não estivesse aqui hoje também.
— O que você quer dizer?
— Por bem ou por mal, eu me assumi na hora certa, no momento que tinha que ser.
— Pedro... Eu...
— Eu também te amo, pai.
Estava selado o entendimento entre Silveira e Pedro. Nunca aqueles dois estiveram tão próximos um do outro. O abraço entre pai e filho finalizou a história mal contada que já durava muitos anos.
— Você também é grande, meu filho!
Pedro tomou banho e finalmente pôde se desfazer das sujeiras daquela noite. Assim como a lua, ele precisava se lavar com água corrente para que suas qualidades — ou melhor, a verdade esclarecida — viessem à tona. Muitas coisas mudariam dali por diante, embora outros hábitos persistissem, como as andanças de cueca que Pedro fazia pela casa, uma herança dos costumes do pai.
Na cama, já deitado e atacado pelo sono, Igor esperava ansioso pelo retorno de Pedro, que abriu a porta do quarto com uma expressão de cansaço e os ombros caídos. Quando ele surgiu, Igor respirou fundo.
— Será que eu posso me deitar com meu namorado?
— Depende. Você tem namorado?
— Acho que sim. Só não sei se ele sabe.
Pedro se deitou ao lado de Igor, puxando um pouco do cobertor para si, e o abraçou por trás. No ouvido dele, Pedro cochichou algumas palavras.
— Sua profecia estava certa: meu pai me chamou de grande!
Pedro parecia finalmente compreender tudo o que havia se passado em sua vida nas últimas semanas. Seus medos, seus desejos, suas alegrias e tristezas, seus sentimentos... Tudo parecia conectado e compreensível. Apenas uma coisa o perturbava agora: Gustavo, seu primo. Mas seu corpo estava tão cansado que, naquela noite, não houve tempo para refletir sobre isso. Abraçado a Igor, ele sabia que tudo seria diferente. Teria que enfrentar novas situações, mas também sorriria para novas emoções.
As luzes estavam apagadas no quarto, mas uma janela alta deixava a luz do jardim iluminar o ambiente. Eles olhavam para o verde do gramado enquanto se abraçavam, pela primeira vez, como namorados. Pedro, atrás de Igor, cochichou próximo ao ouvido do amado.
— Você nem vai acreditar. Meu pai já sabia que eu... já sabia de mim.
— Eu acredito. Ele não é a primeira pessoa que me diz que você é gay.
— Não? Quem mais disse?
— Bem, vejamos... Rafa, minha mãe, minha avó...
— Tudo isso?
— Três pessoas, não exagere!
— Já é muita gente. O que eles disseram?
— Isso importa?
— Claro que importa!
— Por quê? Você não é mesmo gay?
— É... sou, mas é que... é estranho isso.
— Você ainda se ofende em ser chamado de gay, não é?
— Acho que sim... Não gosto.
— Então vamos aproveitar que estou morto de cansado e fingir que você não disse isso?
— Não, agora eu quero saber. O que eles disseram?
— Ai, Pedro, está tarde, estou muito cansado. Quase morri afogado em lama...
— Vai, Igor, me conta, por favor!
Igor respirou fundo e abriu os olhos. Pedro largou a cintura do namorado e se afastou um pouco, deixando que ele se virasse para que se olhassem nos olhos. Não perceberam, mas estavam felizes simplesmente por isso: por poder compartilhar, de fato, a intimidade um do outro. Estavam na cama e se sentiam como um casal, algo impensável dias atrás — não tanto pela resistência de Pedro, mas pelas desavenças que os afastavam.
— O que você quer que eu conte?
— O que o Rafa disse a você? Vocês têm tipo um sensor que identifica isso, não é?
— "Vocês"? Você quer dizer "nós, gays"?
— É.
— É, nós temos. Alguns têm. Talvez você também tenha.
— Quando ele disse isso?
— No dia da festa na piscina. Acho que foi ele quem disse...
— E você, o que disse?
— Que não achava que você era...
— Mas você sabia...
— Sabia, claro. Mas só porque tínhamos transado na van. Senão... Sou péssimo, não tenho radar para gays.
— E sua avó?
— Ai, foi tão engraçado... — Igor riu um pouco.
— O que tem de engraçado?
— Minha avó, já de idade, percebendo as coisas. Amo aquela velha!
— Tá, mas o que ela disse?
— Quando chegamos, ela disse que você era meu namorado. Aí eu disse que não, e ela disse: "Ele é só o cara que dorme com você", ou algo assim... Imagina minha avó tirando piadinha...
— Ou seja, todo mundo já comenta.
— E daí? Você não é gay mesmo?
— Sou, mas isso significa que eu dou pinta.
— E se der? Eu dou, e você está aqui na cama comigo.
— Eu sei, mas... sei lá...
— Pedro, posso te pedir uma coisa muito séria?
— O quê? Não, não... Eu sei o que você vai dizer, eu sei que estou errado em pensar assim, mas é que eu não me vejo como...
— Não, Pedro, o que eu vou te pedir é que você me deixe dormir. Por favor, pode ser?
— Pode.
— Obrigado!
— Beijo de boa noite?
— Beijo de boa noite!
Mesmo que estivesse com muita disposição, Igor já não via necessidade em confrontar Pedro. Sabia que o pior já havia passado, pois o mais difícil era aceitar a si próprio—e esse trunfo já havia sido alcançado. Além disso, as atitudes de Igor, que contrariavam os pensamentos de Pedro, haviam desconstruído sua homofobia. Ele já tinha o que mais desejava: a companhia de Pedro. O resto poderia ser conquistado.
O casal acordou tarde naquele dia, afinal, precisava recuperar as energias. Pedro foi o primeiro a despertar. Sentiu as pernas abertas e relaxadas. A brisa do início da tarde refrescava suas virilhas e, em outros tempos, aquilo teria sido muito agradável. Mas não mais. Ao perceber que o quadril de Igor se desprendia do seu, ele acordou.
Esfregou os olhos com as mãos e se espreguiçou na cama. Sentiu seu corpo se encher de energia e, aos poucos, voltou a raciocinar. Olhou para o lado e viu o namorado ainda dormindo, encolhido no canto da cama. Pedro se aproximou e o beijou no rosto. Enquanto o olhava, sorriu e se perguntou: "Por que eu não vi isso antes?"
Ele se levantou e seguiu para o banheiro, onde escovou os dentes. Nesse ínterim, Igor acordou, mas permaneceu deitado, refletindo sobre o que seria de seu pai dali em diante. Isso impactaria diretamente sua própria vida. Pensou em si mesmo e em como lidaria com a nova realidade.
Pedro retornou ao quarto e foi direto ao guarda-roupa, dando as costas para Igor.
— Quando você vai deixar eu tocar a sua bunda?
Pedro se virou para o namorado e sorriu.
— O quê?
— Você tem um bumbum tão bonito.
— Igor, não começa...
— Mas eu só estou falando... Não posso achar o corpo do meu namorado bonito?
— Pode, mas logo a bunda?
— Você não gosta da minha? Por que eu não posso gostar da sua?
— Você sabe por quê.
Pedro se aproximou da cama e sentou-se. Enquanto vestia a camisa, Igor o observava, ainda deitado. Já vestido, Pedro continuou a conversa.
— Então eu nunca vou poder ser ativo também?
— Mas você...? Igor, vá com calma.
— Estou só provocando, claro. Mas não pense que vai fugir de mim. Uma hora ou outra, você vai ter que ceder.
— Por quê? Você não pode gostar só de uma coisa, e eu de outra?
— Não.
— Por que não?
— Porque não é assim que funciona. Não me veja como alguém diferente de você. Eu sou homem também, não esqueça disso... Ai, Pedro, não me faça essa cara...
— Eu deixo você pegar, se quiser. Mas só isso, só pegar. Nada de enfiar dedo ou coisa pior.
— Coisa pior? — Igor riu. — Tipo o meu pinto?
— Tipo isso.
— Ok, vou me contentar com isso. Por enquanto!
Pedro se deitou na cama, com o tronco encostado na cabeceira. Igor se aproximou e apoiou a cabeça no peito dele, enquanto recebia um cafuné. Os dois ficaram em silêncio, parecendo não pensar em nada e, ao mesmo tempo, compartilhando o mesmo temor. Olhavam para a porta do quarto e imaginavam o que aconteceria quando finalmente saíssem dali juntos.
— Cadê todo mundo?
— Não sei, não vi ninguém quando fui ao banheiro.
— Não procurou por eles?
— Não.
— Será que seu pai saiu?
— Não sei...
— Eu queria ligar para minha mãe.
— Quer que eu traga o telefone?
— Quero.
Antes que Pedro saísse do quarto, bateram na porta e, em seguida, Melissa entrou. Sentou-se ao lado dos dois com um sorriso no rosto. Virou-se para Igor e o abraçou também.
— Só uma pessoa poderia fazer isso. O seu namorado. Só não sabíamos quem ele poderia ser. Ai, sério, estou muito desapontada com vocês. Eu imaginava esse dia de outra forma. Achava que vocês começariam a ter um casinho e, depois, teriam que contar para alguém, para que essa pessoa desse cobertura. Mas não! Tinha que vir um ladrão safado e estragar tudo!
— E onde estão os dois?
— Na cozinha. Eu já estava vindo chamar vocês para almoçar. Ainda bem que já acordaram.
— Eles estão esperando por mim?
Todos esperavam por Pedro há muito tempo. Por isso, ele se sentiu idiota. Naquele momento, pôde perceber que, durante anos, vivera dentro de um casulo rígido e que todos ao seu redor o conheciam melhor do que ele mesmo. Era como se, esse tempo todo, Pedro estivesse agindo erroneamente e todos soubessem, mas ninguém tivesse coragem de lhe mostrar o caminho certo.
E se esse dia nunca chegasse? E se Igor nunca tivesse ido morar com ele no casarão? Quanto tempo mais seria necessário para que Pedro se revelasse para si mesmo?
Não havia como evitar a sensação de traição, embora soubesse que essa omissão fora motivada por boas intenções.
— Vão na frente, eu vou ao banheiro.
— Então vamos, cunhado!
Melissa segurou a mão de Igor e o levou para a cozinha. Lá, o ex-garoto se sentiu um pouco acuado, pois a situação havia mudado. Silveira e Paula estavam sentados à mesa e pareciam cochichar quando os dois chegaram. Igor olhou para o tio e se sentiu responsável por tudo aquilo. Mas ainda não estava claro se essa responsabilidade era algo bom ou ruim. Silveira percebeu que aquele não era o mesmo Igor sorridente, então se esforçou para parecer mais acessível para o sobrinho.
— Sente-se aqui do meu lado, Igor!
Ele se dirigiu até a cadeira e se sentou.
— Não sei se digo "bom dia" ou "boa tarde" — disse Igor.
— Boa tarde! — respondeu Silveira. — Dormiu bem?
— Sim.
— E o braço?
— Não dói.
— Fiquei preocupado com o seu braço.
— Eu também, mas ele parece melhor. Acho que nada interferiu na minha recuperação.
— E o Pedro?
— O Pedro? — perguntou Igor, corado.
— Sim.
— O que tem ele?
— O que tem vocês?
— O que o senhor...
— Não me chame de senhor!
— Tá, mas o que ele tem a ver com o meu braço? — se fazendo de desentendido.
— Com o seu braço eu não sei, mas o que ele tem a ver com o seu coração?
Igor abaixou a cabeça e, com a mão esquerda, esfregou um dos olhos.
— Eu posso tomar um copo de suco?
— Claro! — respondeu Paula, que logo o serviu.
— Tio, eu não sei o que o senhor quer de mim.
— Quero que pare, por favor, de me chamar de senhor. Me diga o que há entre você e o Pedro.
— A gente se gosta.
— Você gosta dele?
— Gosto.
— Eu nunca pensei que você pudesse gostar dele. Talvez ele gostasse de você, mas não achei que o contrário fosse possível.
— Eu achei que você tivesse nos colocado no casarão juntos justamente por isso.
— Não. Eu realmente sugeri que vocês fossem para lá para proteger o casarão.
— Não acredito!
— E por que eu mentiria?
— Não sei... Mas não me parece uma ideia desinteressada essa de nos pôr juntos, sabendo que nos odiávamos.
— Eu não sabia que se odiavam. Soube depois.
— E agora?
— E agora... Bem, vocês estão aí.
— E você não se importa?
— Prefiro ver vocês felizes. Não acha que isso é mais importante?
— Você já parou para pensar em tudo o que pode acontecer daqui para frente? Tudo bem para o senhor que seu filho seja gay?
— Se for para ele... Eu vi uma pessoa muito querida provocar a própria morte por causa disso. Isso me fez repensar algumas coisas.
Igor voltou a abaixar a cabeça e tomou um gole do suco. Ele ainda parecia constrangido. Para ele, não parecia possível que algo com o qual ele estava acostumado a imaginar como uma situação complicada se resolvesse assim tão facilmente.
— Você tem medo de mim, Igor?
— Um pouco.
— Mas por quê?
— Não sei. Parece fácil demais.
— Hoje pode ser, mas eu demorei anos para chegar a esse ponto. Foi mais fácil aceitar.
— Às vezes o caminho mais fácil não é o melhor! — provocou Igor.
— Mas na maioria das vezes somos nós que complicamos as coisas. Não acha?
— Então... Eu sou o namorado do seu filho e para você tudo bem?
— Está tudo bem para vocês? — Igor baixou a cabeça. — Está tudo bem para você?
As lágrimas foram inevitáveis. Uma gota caiu dentro do copo de Igor. Ele parecia não acreditar que a felicidade era possível, mesmo que durante toda a sua vida essas alegrias lhe fossem negadas. Silveira entendeu que Igor se sentia aliviado por conseguir ser aceito e passou a mão em seu ombro.
— Não foi fácil para mim, Grande, mas depois eu pensei que também não fosse fácil para o Pedro. As coisas se tornaram mais fáceis para mim, pois é muito mais fácil julgar.
Pedro surgiu na cozinha e todos o olharam. O rapaz se espantou com aqueles olhos, pois todos estavam lacrimejando. Igor foi o primeiro a se voltar para onde estava. Baixou a cabeça novamente e continuou tomando o suco.
— Sente-se aí, meu filho. Vamos comer! — disse Paula.
Ele puxou a cadeira ao lado de Igor e, por cima da cabeça dele, Pedro olhou para o pai, que chorava e sorria.
— Há muito tempo eu esperava por esse momento.
— Vamos comer?
Enquanto o almoço acontecia, Pedro finalmente pôde se sentir parte de uma família. Não era mais um estranho, nem mesmo para si próprio. A sensação de calma lhe invadia, mas ele recebia aquilo com muita cautela. Assim como Igor, era incomum que todos naquela mesa aceitassem sua condição tão rapidamente, mesmo que, em teoria, já soubessem dela. Em compensação, ele tinha coragem em seus pulmões para arriscar ser quem era. Sem dúvida, um sentimento novo. A diferença agora, percebida por todos, é que Pedro havia se tornado um ser sociável, pertencente a algo, parte integrante de uma família.
E ao mesmo tempo em que tudo havia mudado, nada mudou. Pedro ainda era o mesmo. Isso o fazia se sentir confortável e perder, aos poucos, o medo da mudança. Ele percebia que não precisaria abandonar velhos hábitos ou adotar novas atitudes para seguir sendo quem era. Sua cor preferida ainda era o verde e seu quarto ainda tinha o mesmo cheiro de lar. O mundo não havia mudado! Mas o quarto não era mais sinônimo de reclusão, mas sim de retorno a si mesmo.
Quanto a Igor, pouco havia se alterado, afinal, seu maior desejo era nunca mais ter que lutar por algo que lhe era de direito. Era depositar sua segurança em outra pessoa. E que sorte! Pedro era exatamente alguém com esse perfil protetor. Ainda assim, parecia inacreditável alcançar a felicidade de maneira tão fácil, quando isso nunca lhe pareceu acessível. Embora soubesse que o mundo inteiro estava errado, a ideia de um homossexual feliz surgia mais como uma lenda do que como uma realidade. E, convivendo com a realidade que escolheu desde sempre, a de se aceitar como era, Igor já se preparava para simplesmente viver dignamente, com ou sem felicidade. Não sabia ele que a tal felicidade poderia estar a menos de trinta centímetros de seu braço: bastava esticá-lo, pegar a jarra e despejá-la em seu copo!
— ...então eles disseram que o outro pedreiro, que também estava envolvido, demorou muito para chegar. Por isso o primeiro pedreiro, o que ameaçou vocês, demorou tanto para sair do casarão. Enquanto ele esperava o outro, aproveitou para levar mais coisas.
— E como eles iriam entrar no casarão com uma caminhonete? Só se eles arrombassem o portão. — disse Pedro.
— Eles devem ter feito cópia da chave. Não sei, Pedro, mas tudo indicou que a intenção era de fato roubar os pisos.
— Mas para quê? Que utilidade eles teriam? — questionou Igor.
— Eles já tinham um comprador. Uma loja de material de construção, mas não soltaram o nome da loja.
— Tio, você nunca pensou em vender os pisos para essas lojas antes?
— Pensei, até tentei. Mas eles pagam muito mal, não vale a pena. O jeito vai ser assumir o prejuízo ou arrumar quem os compre.
— Por que não mudamos esse assunto indigesto e conversamos sobre outra coisa? — interrompeu Paula.
— Como o quê?
— Como o nome do hotel, que até hoje não decidimos como vai ser.
Todos na mesa riram da sugestão, pois há muito o nome do hotel havia provocado discussões calorosas no seio daquela família. Apenas Igor não riu e não entendeu a tentativa de reanimar aquele almoço.
— Como não sabem o nome do hotel? Eu achei que ele já tivesse sido muito bem escolhido!
— Claro que não, Igor. Que nome você acha que teria o hotel? — perguntou Pedro, aos risos.
— Gente, mas não é óbvio? “O Casarão”!
— Simples assim?
— E por que não? A ideia é preservar a arquitetura do prédio, fazer com que os hóspedes se sintam em uma casa antiga, como se fossem convidados e não clientes. É como se fosse uma mansão, onde todos se conhecessem e se sentissem familiarizados e blá, blá, blá... “O Casarão”, sinônimo de casa grande.
— Ou seja, tantos anos para tirar o Pedro do armário e tantos meses para escolher um nome para o hotel, e a resposta estava bem aqui: Igor, menino sapeca! — brincou Melissa.
— Você gosta do nome, pai? — perguntou Pedro.
— Eu? São vocês dois que devem gostar, não são vocês que vão morar lá quando estiver tudo pronto?
— Morar lá?
— Sim, vocês não querem? Acham muito cedo para morarem juntos?
— Morar junto? Igor e eu?
— Não seria legal?
Seria! De fato, muito cedo para morarem juntos, mas já estava claro que também já estava tarde. Não havia mais um lar para Igor retornar, sua mãe estava muito bem instalada e satisfeita. Pedro estava prestes a se formar em engenharia civil e também já tinha chegado a hora de sair da casa dos pais. Sim, era cedo para ficarem juntos debaixo do mesmo teto, mas também não tinham percebido tarde que desejavam um ao outro? E nunca estariam sozinhos, haveria sempre um hóspede a quem receber e sempre algo para fazer. Pedro e Igor se olharam por um instante e transmitiram um para o outro o medo de estragarem tudo o que já haviam conquistado até ali.
— Eu tenho medo disso.
— Eu também, mas, sinceramente, não me vejo mais morando nessa casa.
— Bem, eu nem tenho mais casa!
— Então, nós temos um casarão para cuidar!
E, mesmo sendo grande, o casarão se resumiria a um único lugar para aqueles dois.
Observeja~~~> Gente esse era para ser o último capítulo, porém tem umas pontas soltas, 1º- A história que Pedro inventou para se livrar de Tatiana usando o Igor.
2°- O castigo do pai de Igor que ainda não decidir qual vai ser.
3º- um final digno para o Rafael amigo de Igor.
Então pelos próximos três dias, vou me dedicar na escrita desses capítulos, vou postar assim que possível, para finalizar com 30 capítulos.
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Comentários (8)
ParteenJ: Esqueceu da gente?
Responder↴ • uid:1dqlc6amzyw0ParteenJ: Aguardando os próximos capítulos, fiquei o dia ontem esperando kkkkk
Responder↴ • uid:r7c792jzEdson: Estou aguardando o termino Quero ficar feliz assim como senti raiva emoção e tbm lacrimejei muito bom e viver o conto Aguardo o final
Responder↴ • uid:830wykal8mMarcos: Adorei 👏🏿👏🏿👏🏿👏🏿
Responder↴ • uid:3ynzgfs5t0cEdson: Eu li tds os capítulos até agora uma história incrível de medos superações e aceitamos tbm Parabens pelo seu belo conto Eu passei por isto no cedo de minha família pais e irmãos foi muito difícil pra mim mas hoje estou aqui firme e forte
Responder↴ • uid:830wykal8mPA22: Fiquei triste pelo guga, isso é tão comum e tão triste, mas que bom que a família dele conseguiu aceitar o Pedro como ele é, porém não tira a culpa do Silveira da morte do sobrinho.
Responder↴ • uid:2ql4b6xijParteenJ: Parece que eu tava lendo já que o Pedro tinha interpretado mal no final do capítulo anterior rs
• uid:2s7bo5h7tz4ParteenJ: Faltou 4 e 5, o Pedro finalmente superando esse medo de se assumir publicamente, quebrando os traços homofóbicos que ainda tem (digo fora da casa) e se entregando por completo
• uid:2s7bo5h7tz4